A Organização Mundial da Saúde (OMS) declara oficialmente nesta terça-feira (25), em Genebra que o continente africano está “isento de poliovírus selvagem”, que provoca a doença.
“Graças aos esforços mobilizados por governos, profissionais de saúde e comunidades, mais de 1,8 milhão de crianças foram salvas desta doença”, afirmou a OMS em um comunicado publicado antes da cerimônia. O evento é considerado histórico. O fim dos casos de “pólio” na África é uma etapa crucial na erradicação mundial da enfermidade.
O anúncio oficial, por videoconferência, reúne o diretor-geral da OMS, o etíope Tedros Adhanom Ghebreyesus, a diretora da organização para a África, Matshidiso Moeti, assim como os bilionários filantropos Aliko Dangote e Bill Gates, entre outros.
“É uma vitória formidável, um alívio”, declarou à AFP o doutor Tunjui Funshuo, do comitê Pólio Nigéria da associação Rotary International. “Há mais de 30 anos começamos este desafio. Dizer que estou feliz é um eufemismo!”, disse o médico nigeriano, que dedica a vida a esta causa.
Doença infecciosa aguda
Provocada pelo “poliovírus selvagem” (PVS), a poliomielite é uma doença infecciosa aguda e contagiosa que afeta principalmente as crianças. Ela ataca a medula espinhal e é capaz de provocar uma paralisia irreversível.
A doença era endêmica em todo o planeta até o desenvolvimento de uma vacina nos anos 1950. Os países mais ricos tiveram acesso ao medicamento rapidamente, mas Ásia e África continuaram durante muitos anos como focos infecciosos. No Brasil, o último caso foi registrado em 1989.
Em 1988, a OMS contabilizava 350.000 casos em todo o mundo e, oito anos depois, mais de 70.000 apenas na África. Graças a uma campanha coletiva incomum e a grandes esforços financeiros (US$ 19 bilhões em 30 anos), somente dois países do mundo apresentam atualmente contágios de “poliovírus selvagem”: o Afeganistão, com 29 casos em 2020, e Paquistão, com 58 casos.
Nigéria
Até recentemente, a Nigéria, um país de 200 milhões de habitantes, também integrava a lista. No início dos anos 2000, era considerada um epicentro da doença.
Na região norte do país africano, de maioria muçulmana, a pressão de grupos salafistas interrompeu as campanhas de vacinação contra a pólio entre 2003 e 2004. Um boato afirmava que a vacina era uma ferramenta de um grande complô internacional para esterilizar os muçulmanos. As autoridades precisaram fazer um grande trabalho de conscientização com os líderes tradicionais e religiosos para convencer a população a vacinar os filhos.
Mas o conflito com o grupo extremista Boko Haram, em 2009, acabou com as esperanças de erradicar a doença na década passada. Em 2016 foram detectados quatro novos casos de poliomielite no estado de Borno (nordeste), foco da insurreição jihadista.”Naquele momento, 400.000 crianças ficaram à margem das campanhas médicas devido à violência”, recorda o doutor Funsho.
A segurança continua extremamente volátil no nordeste da Nigéria, onde o Boko Haram e o Estado Islâmico da África Ocidental (Iswap) controlam grandes áreas, especialmente ao redor do Lago Chade. Nas áreas “parcialmente acessíveis”, as campanhas de vacinação foram organizadas com a proteção do exército e de milícias de autodefesa, explicou o médico Musa Idowu Audu, coordenador da OMS para o estado de Borno.
Nas zonas totalmente controladas pelos jihadistas, a OMS e seus sócios estabeleceram contato com a população nas estradas ou nos mercados, para formar uma rede de “informantes de saúde” e “sentinelas” que alertavam sobre casos. Quase 20 profissionais da saúde e voluntários morreram nos últimos anos no nordeste da Nigéria nesta campanha, recorda o doutor Audu.
Atualmente, 30.000 crianças nigerianas permanecem sem vacina, um número “muito baixo” para que aconteça uma transmissão epidêmica, de acordo com os especialistas.
Fonte: G1