Obrigação do plano de saúde de custear a cirurgia plástica de caráter reparador ou funcional após bariátrica

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Em uma de nossas colunas, intitulada “Judicialização de planos de saúde: uma introdução ao tema”, explicamos, com fins introdutórios, o que seria planos de saúde e suas estruturas básicas, definindo, nos termos da lei, o que são Plano Privado de Assistência à Saúde e Operadora de Plano de Assistência à Saúde, elucidando, de forma breve, como funciona a judicialização para enfrentar questões relacionados aos planos de saúde.

Pensando nisso, trouxemos um tema importante relacionado à questão, especialmente por conta de decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que sedimentou a obrigatoriedade de cobertura, por parte dos planos de saúde, de cirurgia de caráter reparador ou funcional indicada pelo médico assistente, em paciente pós-cirurgia bariátrica[1].

Que a cirurgia bariátrica era de custeio obrigatório por parte dos planos de saúde, muitos já sabiam. A novidade é que o STJ firmou entendimento de que as cirurgias plásticas reparadoras também devem ser cobertas pelo plano de saúde, tendo a decisão sido tomada em sede de julgamento de Recurso Repetitivo. Isto quer dizer que o julgamento do STJ é de vinculação obrigatória, ou seja, todos os tribunais nacionais devem observar esse entendimento e cumprir o que nele está estabelecido, reduzindo a possibilidade de a operadora do plano de saúde negar a autorização para esses procedimentos.

Os Ministros do STJ ponderaram que o plano de saúde deve arcar com os tratamentos destinados à cura da doença, incluídas as suas consequências, não bastando que a operadora do plano de assistência médica se limite ao custeio da cirurgia bariátrica, mas as resultantes dobras de pele ocasionadas pelo rápido emagrecimento, também, devem receber atenção terapêutica. Na prática, o STJ entendeu que essas cirurgias estéticas reparadoras são uma extensão da bariátrica e fazem parte do tratamento da condição de saúde, que importou na realização do procedimento, ou seja, a obesidade mórbida.

E ainda, no artigo anterior falamos, também, da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e de sua competência de elencar o que as operadoras de planos de saúde tem obrigação de cobrir financeiramente, através de um rol de procedimentos. A decisão do STJ afasta o que nós chamamos de rol taxativo dos procedimentos reparadores pós-bariátrica. Assim, a dermolipectomia abdominal (substituída pela abdominoplastia) e a diástase dos retos abdominais são procedimentos obrigatórios e expressos no rol, mas meramente exemplificativos, pois todos os outros procedimentos cirúrgicos de natureza reparadora devem ser custeados pelos planos de saúde.

Todavia, buscando o equilíbrio na relação entre consumidor e operadora de plano de saúde, o STJ fez questão de firmar tese de que não é qualquer cirurgia plástica que estará coberta para os pacientes que se submeteram à cirurgia bariátrica, mas tão somente aquelas de natureza reparadora, devidamente indicadas pelo médico assistente.

Segundo o entendimento do STJ, existe, portanto, três procedimentos de cirurgia plástica pós-bariátrica: (i) os procedimentos que efetivamente se prestam a finalidades reparadoras; (ii) os procedimentos que possuem finalidades apenas estéticas; e (iii) os procedimentos estéticos que podem se prestar a finalidades reparadoras para determinadas funções de partes do corpo, havendo comumente, nesses casos, indicação médica especializada.

Facilitando, para que a operadora de plano de saúde negue o procedimento, ela deve demonstrar outra finalidade para a cirurgia, que não a reparadora.

Se houver dúvidas justificadas acerca do caráter eminentemente estético da cirurgia, a operadora de plano de saúde pode se socorrer do procedimento da junta médica estabelecido em normativo da ANS. Junta, esta, custeada pelo plano de saúde, que deverá ser formada por três profissionais, sendo eles: o médico assistente do beneficiário (o médico do paciente), o da operadora de plano de saúde e o desempatador.

Para que não gere argumentações de favorecimento, esse desempatador é escolhido, de comum acordo, entre o médico assistente (o médico do paciente) e o da operadora de saúde, afastando eventuais alegações de parcialidade do desempatador.

Com isso, o STJ fixou as seguintes teses que devem ser obedecidas pelas operadoras de plano de saúde e pelos tribunais nacionais (em caso de judicialização):  (I) É de cobertura obrigatória pelos planos de saúde a cirurgia plástica de caráter reparador ou funcional indicada pelo médico assistente, em paciente pós-cirurgia bariátrica, visto ser parte decorrente do tratamento da obesidade mórbida; (II) Havendo dúvidas justificadas e razoáveis quanto ao caráter eminentemente estético da cirurgia plástica indicada ao paciente pós-cirurgia bariátrica, a operadora de plano de saúde pode se utilizar do procedimento da junta médica, formada para dirimir a divergência técnico-assistencial, desde que arque com os honorários dos respectivos profissionais e sem prejuízo do exercício do direito de ação pelo beneficiário, em caso de parecer desfavorável à indicação clínica do médico assistente, ao qual não se vincula o julgador.

E como é na prática caso o beneficiário do plano de saúde tenha a negativa da cirurgia a que faz jus? Nesse caso, é necessário procurar um advogado que irá, por meio de uma ação judicial, provocar o Poder Judiciário com fins de que determine a operadora de saúde o custeio das cirurgias.

Tenha em mãos as provas de que é preciso continuar o tratamento, bem como a negativa que recebera da operadora de saúde, entre outros documentos essenciais à propositura da ação. Avalie, junto com seu advogado, se é cabível um pedido liminar para se realizar o procedimento cirúrgico com urgência, além do pedido de danos morais  por quebra de contrato.

Também é importante ficar atento ao risco de a operadora de plano de saúde cancelar a Apólice, o que, se ocorrer durante o tratamento da morbidade, deve ser levado a um advogado a fim de analisar o cabimento de Ação Judicial para que seja mantido o plano até se finalizar todos os procedimentos necessários. O cancelamento tem se tornado comum atualmente e, por isso, traremos outro artigo específico sobre o tema neste Portal.

Autores: Daniele Queiroz de Souza. Graduada em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP); Pós-graduada em Direito Médico, Odontológico e da Saúde pela USP – Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto; Pós-graduada em Ordem Jurídica e Ministério Público pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (FESMPDFT); Membro Efetivo Observatório Nacional de Direito Médico e da Saúde; Secretária-Geral (2023) da Comissão de Gestão, Empreendedorismo e Inovação Jurídica OAB/DF – Subseção Taguatinga; Membro da Comissão de Direito Médico da OAB/DF; Advogada. danieleqsadv@gmail.com

Flávio Dias de Abreu Filho. Graduado pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB); especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) em Brasília/DF; mestrando em direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) em Brasília/DF, diretor jurídico da Associação de Empresas de Engenharia e Limpeza Urbana do Brasil – ALUBRÁS, advogado sócio do escritório Abreu&Abreu advogados. diasdeabreu@abreueabreu.com


[1]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Tema repetitivo 1069. Relator Ricardo Villas Bôas Cueva. Brasília, 19 de setembro de 023. Acessível via https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&cod_tema_inicial=1069&cod_tema_final=1069. Acessado dia 26 de outubro de 2023.

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