Retocolite ulcerativa: a importância do diagnóstico e tratamento corretos

Ampliação das terapias disponíveis no SUS para a doença está em discussão em consulta pública, que tem o objetivo de ouvir a sociedade no processo de decisão

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Episódios recorrentes de diarreia, além de dores abdominais, perda de peso, fadiga e fraqueza, marcam o dia a dia de quem vive com retocolite ulcerativa. Juntamente com doença de Crohn, trata-se de uma das principais formas das doenças inflamatórias intestinais (DIIs), que, segundo estimativas, atingem aproximadamente 6,8 milhões de pessoas no mundo.

“A retocolite ulcerativa é caracterizada por uma inflamação restrita ao intestino grosso (cólon) e sua parte final, o reto”, explica o coloproctologista Rogerio Saad, presidente do Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil (Gediib). “A agressão se dá na parte mais superficial (interna) do cólon, especificamente na mucosa e submucosa, e suas manifestações são classificadas como leve, moderada ou grave, de acordo com a intensidade da inflamação e proctite, hemicolite ou pancolite de acordo com sua extensão”, continua o médico.

Diagnóstico e jornada

Embora possa acometer crianças, a retocolite ulcerativa costuma surgir no final da adolescência e tem seu pico de incidência entre os 20 e os 40 anos de idade. As sucessivas idas ao banheiro e os desconfortos gerados pela condição têm impactos físicos e emocionais, limitam a vida social e os estudos e afetam o trabalho e a rotina dos pacientes. E, de acordo com o especialista, o conjunto de sintomas inespecíficos, que podem ser avaliados como uma simples diarreia ou outros problemas intestinais, muitas vezes atrasam o diagnóstico da doença – pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Crohn (ABCD) mostrou que a jornada até a confirmação do problema em geral leva mais de um ano, podendo chegar a três anos2. “A demora pode se dar pelo fato de a pessoa não levar tão a sério ou não se preocupar com os sinais, como diarreia com presença de muco ou sangue, e não buscar ajuda. Da mesma forma, o não reconhecimento e/ou a não valorização desses sintomas pelos médicos não especialistas na área podem contribuir para este atraso no diagnóstico de DII”, pondera Rogerio Saad.

Para fechar o diagnóstico, esclarece o médico, o primeiro passo é ouvir o relato do paciente, seus sinais e sintomas e fazer uma avaliação física. “Imagine um quebra-cabeça com alguns quadradinhos que se encaixam”, exemplifica. A peça seguinte são os exames laboratoriais para detectar atividade inflamatória no organismo. Então vêm a ileocolonoscopia – uma exploração endoscópica do intestino grosso (cólon) e o final do intestino fino (íleo) – e a biópsia. Exames de imagem, como tomografia e ressonância magnética, também contribuem nesse processo.

Tratamento

“A retocolite ulcerativa é uma condição autoimune, ou seja, o próprio organismo começa a produzir anticorpo contra o intestino, gerando a inflamação. É também crônica. Portanto, até o momento, não tem cura”, pontua a médica Andrea Vieira, vice-presidente da Associação de Pacientes ABCD, que atua com foco em doenças inflamatórias intestinais no País. Seu manejo, assim, se baseia no controle do processo inflamatório. Em outras palavras, o objetivo é conter a fase aguda da doença, evitando o aparecimento dos surtos. Para isso, felizmente, o plano terapêutico hoje conta com uma ampla gama de medicamentos disponíveis. “A primeira categoria é a de anti-inflamatórios de ação tópica, derivados do ácido 5-aminossalicílico (5-ASA); de uma maneira geral, de 30% a 50% dos pacientes podem responder bem a eles”, diz Rogerio Saad. “Há ainda os imunossupressores e, na falha dessas medicações, contamos com a terapia biológica e as pequenas moléculas, que são compostos químicos de uso oral”, lista. Os biológicos são uma classe inovadora de fármacos que atuam em alvos específicos responsáveis pela inflamação.

“Estamos falando de uma doença complexa, causada por uma interação entre fatores ambientais, genética, sistema imunológico e microbioma”, explica Andrea Vieira. “Embora tenhamos avançado muito, as medicações por enquanto só atuam na esfera do sistema imunológico. Então, como em outras condições desse tipo, quando se bloqueia seu avanço de um lado, ela vai buscando caminhos para progredir de outro”, esclarece a vice-presidente da Associação de Pacientes e médica, que conhece de perto a realidade de inúmeros pacientes do Brasil.

“É fundamental contar com um arsenal variado, uma vez que as medicações podem não funcionar em todos os casos”, afirma Saad. “Sem contar que muitas vezes, após um período de boa resposta, o organismo pode acabar produzindo anticorpos contra o próprio medicamento que é inerente a alguns tipos de terapia biológica. Então, é preciso trocar a medicação, e para isso temos que ter alternativas adequadas”, justifica. “Sendo assim, à medida que são lançadas novas medicações, com novos alvos terapêuticos, torna-se importante sua incorporação e disponibilização pelos sistemas de saúde”, defende Saad.

O processo para a definição de incluir ou não uma nova terapia no Sistema Único de Saúde (SUS) passa pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (Conitec), e, após a análise e parecer inicial, é encaminhado para a consulta pública. A pauta hoje é justamente sobre a inclusão de um imunobiológico para o tratamento da retocolite ulcerativa pelo SUS. “Para que a discussão e a participação na consulta pública sejam amplas e representativas, é fundamental a contribuição não apenas de médicos e profissionais da área de saúde na discussão, mas também de pacientes, de familiares e da sociedade como um todo”, recomenda Saad. “A consulta pública democratiza. Todos opinam de forma ampla sobre as alternativas de medicações que podem levar a um desfecho mais favorável da doença”, completa Andrea Vieira.

Fonte:NEWSLAB

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