VÍRUS EM TRANSFUSÕES

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Por Milton Artur Ruiz

As transfusões de sangue e a hemoterapia no Brasil são procedimentos considerados seguros. Desde o início de suas atividades em 1940, no Hospital Geral de Salvador, na Bahia, ser doador de sangue era visto como um ato de cidadania, comparado ao papel de um soldado a serviço do país, com direitos e deveres, especialmente em tempos de guerra. Em 1941, o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo assumiu um papel crucial no desenvolvimento dos serviços de hemoterapia no país.

Com o avanço da medicina, o sangue e seus componentes tornaram-se fundamentais em cirurgias, emergências obstétricas e no tratamento de queimaduras. Esses avanços foram possíveis graças ao conhecimento acumulado sobre os riscos das transfusões braço a braço, que resultavam frequentemente em óbitos. A descoberta dos grupos sanguíneos por Landsteiner, em 1900, e do sistema Rh por Levine, na década de 1930, representaram marcos fundamentais para a segurança transfusional.

No entanto, à medida que os serviços de hemoterapia se expandiam, percebeu-se que o sangue também podia ser fonte de infecções, como bactérias e vírus. Surgiram regulações para mitigar esses riscos, especialmente em relação às hepatites, que eram reconhecidas como transmissíveis por transfusão. Os testes obrigatórios eliminaram o uso de doadores remunerados.

O maior desafio surgiu com a epidemia de HIV, que impactou gravemente pacientes hemofílicos e evidenciou a necessidade de testes rigorosos. Em 1985, a triagem obrigatória para HIV foi implementada globalmente e, no Brasil, tornou-se obrigatória em 1989. Outros testes foram introduzidos para doenças como febre amarela, sífilis (lues), Chagas, hepatites e HTLV.

Atualmente, o Brasil enfrenta desafios com vírus emergentes, como Chikungunya, oropouche e dengue, sendo este último motivo de preocupação crescente devido à sua alta incidência e potencial de transmissão transfusional. A transmissão da dengue (DENV) por transfusão de sangue é rara, mas pode ocorrer quando o doador está infectado, geralmente durante o período de incubação, antes do aparecimento dos sintomas. Em áreas endêmicas, essa forma de transmissão representa um risco significativo, pois doadores assintomáticos podem transmitir o vírus aos receptores de sangue.

Estudos médicos apontam que a identificação de doadores infectados durante a triagem é desafiadora, mas essencial. A implementação de testes confiáveis em áreas endêmicas é crucial para garantir a segurança do suprimento de sangue. Para mitigar esse risco, recomenda-se que bancos de sangue em áreas endêmicas adotem testes de triagem para o DENV e para transplantes, a triagem deve incluir testes de PCR, incluindo amostras de urina, para aumentar a sensibilidade na detecção do vírus e aumentar a segurança transfusional. A adoção de testes NAT para DENV é uma medida baseada em evidências que pode prevenir a transmissão transfusional da dengue, especialmente em pacientes imunocomprometidos e mais vulneráveis a infecções graves.

Concluindo, mesmo com os avanços nos testes e todas as medidas de segurança, é importante lembrar que a melhor transfusão é aquela que não é realizada. Sempre que possível, deve-se buscar alternativas ao uso de sangue.

MILTON ARTUR RUIZ
Médico, coordenador da Unidade de TMO e Terapia Celular do Hospital Infanto Dom Henrique da Associação Portuguesa de Beneficência de Rio Preto, Ex-professor de Hematologia/Hemoterapia da USP
@dr.miltonruiz

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