Bactérias resistentes também são ameaça fora dos hospitais

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Microrganismos multirresistentes são uma ameaça significativa à saúde global, destacada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 2019. Esses patógenos, que desenvolvem resistência a medicamentos antimicrobianos, comprometem a eficácia do tratamento de infecções.

Enquanto comuns em ambientes hospitalares, a preocupação reside na capacidade dessas bactérias multirresistentes de se espalharem para outras áreas, transferindo genes de resistência a antimicrobianos para diferentes cepas bacterianas. Para entender essa propagação no ambiente, um estudo da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP analisou linhagens da bactéria Escherichia coli, identificando espécies multirresistentes em amostras de solo e água.

Apesar de algumas bactérias causarem doenças, sua importância para a vida humana é notável. A Escherichia coli, presente na microbiota humana, desempenha um papel vital na regulação de processos químicos, como a digestão. No entanto, dependendo da linhagem, pode causar infecções gastrointestinais e extraintestinais. Essa bactéria foi incluída pela OMS na lista de agentes patogênicos prioritários resistentes a antimicrobianos.

O estudo, liderado por João Pedro Rueda Furlan, explora bactérias multirresistentes, definidas por suportar ao menos um agente antimicrobiano de três classes diferentes. A preocupação cresce no ambiente hospitalar, onde as opções de tratamento diminuem com o aumento da resistência, muitas vezes atribuída ao uso intensivo de antibióticos em vários setores.

O trabalho envolveu a coleta de 300 amostras de solo entre 2017 e 2019 em fazendas de pecuária extensiva, conhecidas pelo uso intenso de antimicrobianos, na região metropolitana de Ribeirão Preto (SP) e em Montes Claros (MG). Em colaboração com a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), foram obtidas 200 amostras de água de rios, ribeirões, córregos e lagos entre 2018 e 2020. As bactérias coletadas foram analisadas por métodos microbiológicos e moleculares.

Das amostras de solo, 70 apresentaram presença de E. coli, das quais 41 foram classificadas como multirresistentes. As E. coli multirresistentes na água (64 isolados) indicaram uma taxa acima da recomendada, sugerindo contaminação por atividades humanas. A maioria dessas linhagens de água demonstrou resistência a antimicrobianos clinicamente importantes e uma diversidade de genes de resistência.
As bactérias multirresistentes em amostras ambientais representam um potencial risco à saúde pública, ao meio ambiente e à segurança alimentar. O estudo enfatiza como essas bactérias, presentes na água e no solo, podem se disseminar para os seres humanos por meio do consumo de água e alimentos contaminados.

Observou-se também a versatilidade da E. coli em adquirir resistência por meio de elementos genéticos móveis, destacando sua capacidade de capturar e transmitir novos genes de resistência. A transferência desses genes para outras bactérias, observada no estudo, destaca a comunicação entre bactérias e sua constante evolução em resposta à resistência antimicrobiana.

O desafio global da resistência aos antimicrobianos, que surgiu inicialmente em ambientes hospitalares, agora requer atenção para a presença dessas bactérias no meio ambiente. A disseminação desses microrganismos multirresistentes fora dos hospitais destaca a importância de uma abordagem abrangente para preservar a saúde humana, animal e ambiental. O conceito de Saúde Única enfatiza o papel crucial do meio ambiente, interligando diretamente seres humanos, animais e plantas. A pesquisa, reconhecida com o Prêmio Capes de Tese de 2023 na área de Farmácia, foi orientada pela professora Eliana Guedes Stehling.

Fonte:  Jornal USP

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