Hoje, 31 de julho de 2023, aguarda-se a divulgação de nova Resolução do Conselho Federal de Medicina – CFM sobre a publicidade médica, o que faz gerar o debate sobre as mudanças que podem surgir nessa nova normativa.
Atualmente, é a Resolução do CFM nº 1.974 de 2011 que trata do tema e, mesmo com a complementação em 2015, teve suas vedações mantidas, incluindo-se, no entanto, novas proibições à publicidade médica. De forma ampla, hoje veda-se a divulgação, por exemplo, do famoso “antes e depois” e de imagem de pacientes (mesmo havendo consentimento). Outras vedações são relacionadas à exposição de equipamentos, das instalações das clínicas, de valores promocionais, entre outras.
É claro que a irresignação dos médicos aumentou significativamente conforme o tempo foi passando, afinal, essas normas que tratam da publicidade médica são de 2011 e 2015, época em que a publicidade na internet não era utilizada como é hoje e, muitas vezes, é a diferença entre a sobrevivência ou falência do negócio do profissional.
A publicidade passou a ser parte essencial do trabalho, tendo em vista a difusão das redes sociais. Não há dúvida de que hoje, ao se buscar qualquer prestação de serviço ou fornecimento de produto, o usuário busca, primeiro, a rede social do profissional ou da empresa para confirmar a existência e se aparenta ser de qualidade.
Além disso, a proibição somente recai sobre os médicos, vez que, sendo uma norma do CFM, só é vinculante àqueles profissionais, enquanto diversos outros profissionais da área da saúde já estão autorizados a realizar divulgação de seus serviços, como o dentista que nada lhe impede de divulgar o “antes e depois” de seus pacientes. Assim, porque não permitir que médicos também realizem publicidade assim como se permite a outros profissionais?
Fala-se tanto de concorrência desleal que, diante do exercício de atos médicos por outros profissionais ou de atos que possam ser praticados por mais de uma área da saúde, nada mais justo que permitir também aos médicos a produção de conteúdo a fim de estar nas mesmas condições que outros profissionais. A concorrência é salutar para um ambiente de negócios geridos por uma multidisciplinariedade de profissionais.
Contudo, deve-se atentar para o modo que deve ser feita essa publicidade.
Não se defende aqui a propaganda enganosa ou abusiva, tampouco a mercantilização da medicina. O que se traz para debate é a possibilidade de aos médicos ser lícito realizar publicidade em pé de igualdade a outros profissionais e, mais ainda, que o Conselho se adeque à nova realidade do mercado. Normas antiquadas, desatualizadas, somente prejudicam a relação profissional-paciente, bem como favorece a clandestinidade. O que se precisa fazer é, de maneira educativa, prever normas que permitam essa ampliação da competitividade, mas que não irão ferir os preceitos éticos da profissão, tampouco violar a legislação brasileira de defesa do consumidor.
Na esfera ética, as condenações por publicidade inadequada estão superando uma advertência ou censura privadas, passando a ter divulgação pública e, em alguns casos, até a interdição cautelar do médico com a retenção da carteira de registro do profissional pelo Conselho Regional de Medicina até a conclusão do processo, ficando, assim, impedido de exercer a profissão.
Por mais que se deseje a autorização pelo Conselho Federal de Medicina da publicidade, deve-se atentar para o fato de que, em alguns casos, o que inicialmente parece ser uma publicidade trivial, pode prejudicar. É o que pode vir a ocorrer no caso de eventual alteração normativa que vise permitir o “antes e depois”.
Não há dúvida de que, em um primeiro momento, imagina-se os benefícios de se mostrar aos pacientes os resultados de trabalhos técnicos muito bem executados, mas ainda assim é preciso tomar cuidado, pois se você divulga algo como resultado do “seu procedimento” na internet, isso pode ser considerado como uma vinculação de sua atuação, ou seja, te obriga a entregar aquele resultado que você prometeu; e nós sabemos que a Medicina não é exata, depende das áleas de cada organismo e como cada paciente vai reagir ao tratamento pretendido.
Outro ponto importante é o dever de preservação do sigilo do paciente que vai de encontro à divulgação de sua imagem. Nesse caso, havendo anuência do paciente, ainda assim se caracterizaria a violação ao sigilo?
De modo diverso do nosso posicionamento, o CFM veda a divulgação de imagens de pacientes, mesmo que estes permitam. Ou seja, ainda que o paciente assine qualquer consentimento sobre a disponibilização de sua imagem, o médico está sujeito à aplicação de pena ética pelo Conselho, apesar de que uma indenização fixada pelo Poder Judiciário seria improvável.
Havendo uma autorização expressa e inequívoca do paciente, com possibilidade de revogação da concessão gratuita de imagem a qualquer momento sem necessidade de justificativa e desde que não utilize o profissional médico do conteúdo áudio visual para criar propagandas enganosas ou abusivas com o único intuito de ludibriar e angariar pacientes, não há, na visão dos autores, razões para indenizações judiciais, mesmo havendo espaço para condenações éticas (o que também discordamos).
Publicidades de comercialização de suplementos milagrosos para cura de patologias ou de oferta de cirurgias também milagrosas, sem dúvida, devem permanecer proibidas. A Medicina, ainda que publicizada, não pode perder sua essência que, obviamente, diverge da mercantilização.
Por essas razões, se você pretende realizar publicações ou divulgações de marketing de seu consultório, clínica médica ou hospital, sempre busque informações sobre as permissões do CFM ou de seu conselho de entidade próprio. Recomendamos jamais realizar atividades publicitárias sem saber o que pode ou não pode ser feito, até porque, mesmo que uma agência de marketing ou outra pessoa seja a responsável pelas postagens nas redes sociais, a responsabilidade pelo conteúdo veiculado é do profissional de saúde, ainda que não tenha tido conhecimento prévio do conteúdo.
Autores:
Daniele Queiroz de Souza. Graduada em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP); Pós-graduada em Direito Médico, Odontológico e da Saúde pela USP – Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto; Pós-graduada em Ordem Jurídica e Ministério Público pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (FESMPDFT); Membro Efetivo Observatório Nacional de Direito Médico e da Saúde; Vice-presidente (2023) da Comissão de Gestão, Empreendedorismo e Inovação Jurídica OAB/DF – Subseção Taguatinga; Membro da Comissão de Direito Médico da OAB/DF; Advogada. danieleqsadv@gmail.com
Flávio Dias de Abreu Filho. Graduado pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB); especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) em Brasília/DF; mestrando em direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) em Brasília/DF, diretor jurídico da Associação de Empresas de Engenharia e Limpeza Urbana do Brasil – ALUBRÁS, advogado sócio do escritório Abreu&Abreu advogados. diasdeabreu@abreueabreu.com