O protocolo ABVD é um esquema de terapia clássico utilizado para o tratamento do linfoma de Hodgkin. Ele consiste em um conjunto de quatro drogas quimioterápicas, sendo elas Adriamicina, Bleomicina, Vinblastina e Dacarbazina, e o seu tempo de duração varia de acordo com algumas características da doença. A escolha desses medicamentos é tida como padrão para os pacientes, pois, no geral, apresenta boa taxa de remissão e baixa toxicidade.
A Drª. Valeria Buccheri, coordenadora do Departamento de Linfoma de Hodgkin do Instituto do Cancêr do Estado de Sâo Paulo (ICESP), recorda que até chegar no protocolo ABVD, o tratamento de linfoma de Hodgkin (LH) passou por diversas etapas e foi evoluindo.
No início da década de 40, era utilizada a monoquimioterapia com mostarda nitrogenada. Como resultado, essa terapia apresentava boas respostas, mas elas não se mantinham por muito tempo. 20 anos após, foi introduzido o esquema MOPP, contendo as drogas Mecloretamina, Vincristina, Procarbazina e Prednisona. 68% dos pacientes, em estadiamento avançado, tratados dessa maneira possuíam sobrevida livre de doença de 10 anos.
“Logo após, foi idealizado o esquema ABVD (Doxorrubicina, Bleomicina, Vinblastina e Dacarbazina), inicialmente para casos recidivados/refratários ao MOPP. Posteriormente, foi administrado como parte do tratamento alternado MOPP e ABVD e do protocolo híbrido MOPP/ABV”, a médica conta.
Em pouco tempo, o ABVD se mostrou superior ao MOPP e com menor toxicidade e estabeleceu-se como principal escolha para esse tipo de linfoma. Isso permanece até os dias de hoje.
Quais pacientes podem receber o protocolo ABVD?
De acordo com a Drª.Valeria esse esquema de quimioterapias é o padrão realizado para a grande maioria dos casos de linfoma de Hodgkin.
Entretanto, ele pode, ou não, ser realizado juntamente à radioterapia dependendo do estágio da doença.
“Todos os pacientes com LH são divididos em quatro estádios clínicos, a depender da extensão da doença. Essa é a primeira etapa para se programar uma terapêutica adequada”, ela diz.
Aqueles em estágios precoces (I e II) recebem o protocolo de quimioterapia associado à radioterapia. Já para aqueles em estadiamento avançado (III e IV), o método utilizado é somente a administração das drogas.
Tratamento com ABVD
Quanto tempo o tratamento com o protocolo ABVD irá durar também é determinado pelo estadiamento do linfoma. Sendo que, para alguns casos, ainda leva-se em consideração o risco de recidiva. Ou seja, a possibilidade da doença retornar.
A especialista explica que um ciclo de ABVD consiste na administração intravenosa dos quimioterápicos no 1º e 15º dias de cada ciclo – um ciclo dura 28 dias.
Os pacientes que possuem esse câncer em estadiamento I e II, são divididos em dois grupos conforme o risco de recidiva. Se o risco for:
- Baixo, são administrados dois ciclos de ABVD, com duração de dois meses. Em seguida, é feita a consolidação com radioterapia apenas onde houver linfonodos comprometidos pela doença.
- Alto, são realizados quatro ciclos de ABVD, com duração de quatro meses. Depois, também é feita a radioterapia apenas nos locais comprometidos.
Já no caso da doença em estadiamento avançado, são feitos seis ciclos de ABVD, com duração de seis meses.
“O ABVD, associado ou não à radioterapia, e considerando todos os pacientes, apresenta taxas de cura entre 70% a 95% dos casos. Com algumas exceções, o protocolo tem baixa toxicidade, particularmente para o sangue, e há uma ocorrência muito baixa de infertilidade”, a Drª.Valéria conta.
Efeitos colaterais do ABVD
A médica detalha que as principais reações adversas imediatas são:
- Alopecia (queda de cabelo)
- Náusea/vômito
- Obstipação
- Neutropenia (neutrófilos abaixo de 1000/mm³) e
- Reação alérgica (durante a infusão da Bleomicina)
Geralmente, o nadir, momento entre cada ciclo no qual as contagens de células estão mais baixas e, portanto, a neutropenia está mais forte, acontece entre o 7º e o 12º dia após a administração dos medicamentos.
Entretanto, é possível prevenir e evitar esses efeitos colaterais.
A hematologista informa que “para prevenir náusea, vômito e reação alérgica todos os pacientes são pré-medicados com anti-eméticos potentes e antihistamínicos, pela via intravenosa, 30 minutos antes da quimioterapia. ”
Para os pacientes com neutroenia, é utilizada uma terapia que estimula o crescimento de granulócitos. Dessa forma, a quantidade dessas células volta ao valor considerado como saudável.
Além disso, para aqueles que têm antecedente de infecção viral, por exemplo, pelo vírus da herpes, é feita uma profilaxia.
Falta de Bleomicina
Desde 2017, o Brasil enfrenta desabastecimentos periódicos da Bleomicina, consequentemente, causando o sumiço desse medicamento dos centros de tratamento. Por esse motivos, alguns pacientes passaram a ser tratados apenas com o AVD (Adriamicina, Vimblatina e Dacarbazina).
“Vale ressaltar que as dificuldades encontradas pelo desabastecimento periódico da Bleomicina são decorrentes de termos apenas um único fornecedor no país, que pode não ter condições de atender toda a demanda”, a médica explica.
Mas, ela complementa afirmando que, na maioria dos casos, a indisponibilidade da medicação acontece por poucos ciclos e não impacta no tratamento. Sendo que para esses pacientes que receberam o protocolo AVD, são necessários maiores estudos a longo prazo e com um número considerável de pessoas para avaliar se e como os resultados foram afetados.
O futuro do tratamento do linfoma de Hodgkin
“Considerando todos os pontos mencionados anteriormente, particularmente as altas taxas de cura com poucos efeitos colaterais, e adicionando o baixo custo do protocolo ABVD, a tendência é que ele continue sendo utilizado. É importante frisar que, quanto antes o paciente é tratado, isto é, quanto menor o volume tumoral, maior sua chance de cura e isso vale para a maioria dos tumores”, a Drª. Valeria Buccheri conclui.
Fonte: Revista Abrale On-line