Empresa brasileira desenvolve e exporta DNA polimerases

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A empresa Cellco Biotec, sediada em São Carlos (SP), desenvolveu um processo inédito para produzir, pela primeira vez no Brasil, DNA polimerases com altos padrões de qualidade, em escala compatível para a comercialização.

O empreendimento, que teve apoio do Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), foi tão bem-sucedido que, além de oferecer ao mercado brasileiro enzimas com qualidade comparável às importadas – e com preço mais atrativo –, permitiu à empresa assinar seu primeiro contrato de exportação para a Europa.

A pesquisadora responsável pelo projeto, Amanda Bernardes Muniz, explica que as DNA polimerases são enzimas amplamente utilizadas para a manipulação in vitro do DNA em clonagem, sequenciamento e mutagêneses de DNA, entre outras técnicas, com aplicação, por exemplo, em diagnósticos médicos e análises forenses com base em material genético.

“Apesar de ser um insumo de uso rotineiro em meio laboratorial, o Brasil não tinha uma produção da enzima dentro de padrões rigorosos de qualidade que viabilizasse sua comercialização. Nosso objetivo era produzir, no país, uma enzima com padrões comparáveis aos das que já são comercializadas”, disse Muniz.

Segundo a pesquisadora, que tem formação em física e atua na área de biofísica molecular, os processos de controle de qualidade foram desenvolvidos pela empresa com o apoio da companhia alemã Jena Bioscience, que é uma das financiadoras da Cellco.

“A enzima é produzida em bactérias e, se houver qualquer outro DNA contaminante proveniente da produção, o resultado que se busca com a polimerase fica comprometido. Por isso o controle de qualidade rigoroso é fundamental para a comercialização”, disse Muniz.

“Éramos usuários do produto e sentíamos as dificuldades da dependência em relação à importação”, disse a bióloga Maria Amélia Dotta, que atuava na indústria farmacêutica antes de se tornar uma das fundadoras da Cellco, em 2014.

“As variações de preços, sujeitas a reviravoltas cambiais, causavam problemas para a programação dos projetos e prazos de entrega”, disse Dotta. “Essa experiência no nosso trabalho com biologia molecular nos mostrava que havia ali uma oportunidade de desenvolvimento de um produto – e começamos a explorar isso como um projeto e optamos por submeter à FAPESP.”

A bióloga e a física se conheceram durante o doutorado, no Instituto de Física de São Carlos (IFSC), da Universidade de São Paulo (USP), onde ambas já haviam se aprofundado na pesquisa sobre proteínas recombinantes. Muniz começou a atuar na empresa em 2016 e o projeto foi aprovado pelo PIPE-FAPESP no mesmo ano.

Em 2018, com o processo de produção da enzima já desenvolvido, a empresa obteve novo apoio do PIPE-FAPESP para a fase 2 do projeto, para que fosse possível ganhar escala comercial. “Mesmo antes do fim do projeto o produto já estava no mercado, graças ao aprimoramento da enzima que conseguimos obter no projeto da Amanda”, disse Dotta.

Muniz explica que, com o emprego de engenharia genética, o processo de produção permitiu a obtenção de propriedades melhoradas da enzima – que é especificamente uma DNA polimerase da bactéria Thermus aquaticus (Taq DNA polimerase), uma das mais utilizadas, com crescente aplicação nas áreas de genotipagem e diagnóstica. “Adicionando certos domínios proteicos [partes independentes da cadeia polipeptídica] nessa molécula, conseguimos produzir uma enzima capaz de fazer polimerases mais processivas, isto é, obtivemos uma enzima mais rápida que a Taq normal”, disseMuniz.

Segundo Dotta, o aprimoramento da produção obtido graças à pesquisa garantiu uma excelente resposta do mercado. “Desenvolvemos um produto de qualidade muito alta. Isso nos dá tranquilidade para oferecer um produto que foi exaustivamente estudado e testado”, disse.

Para garantir a qualidade da enzima, é preciso evitar a presença de DNA microbiano e inibidores da reação de PCR em seu processo de preparação – um dos principais desafios para sua produção comercial e habilitação para qualquer emprego tecnológico.

A fim de desenvolver um controle de qualidade capaz de garantir a produção de uma enzima com alto rendimento e pureza, a Cellco utilizou como guia os processos de sua parceira alemã, a Jena Bioscience, que passou a comprar o produto brasileiro.

“Como em todos os produtos da Cellco, desenvolvemos todo o controle de qualidade com base nas exigências aplicadas pela Jena na compra de enzimas de outras empresas. Todos os nossos processos passam pelo controle de qualidade da Jena, que é muito rígido e nos dá segurança”, disse Muniz.

De acordo com Dotta, desde 2018 a Cellco passou a exportar sua enzima para a Alemanha e se tornou o principal fornecedor da parceira Jena Bioscience. A empresa alemã, fundada em 1998, produz e fornece reagentes para laboratórios de pesquisa e indústrias farmacêuticas de vários países.

“Eles investiram na nossa empresa desde o início, possivelmente já projetando que nos tornássemos fornecedores. Eles viam no Brasil um mercado promissor para ciências da vida, em especial para reagentes”, disse a bióloga.

O mercado de DNA polimerases na América Latina, de acordo com as pesquisadoras, estava estimado em R$ 1 bilhão em 2020, com previsão de crescimento de 6,7% anuais até 2025, quando chegará a R$ 1,38 bilhão.

Além das duas fases do projeto de desenvolvimento da enzima – concluído em fevereiro de 2021–, a Cellco também obteve apoio de um projeto PIPE-FAPESP, ainda vigente, para o desenvolvimento de um kit de diagnóstico de COVID-19 por RT-qPCR (transcrição reversa seguida de reação em cadeia da polimerase quantitativa, na sigla em inglês) pelo método multiplex, o que barateia o produto.

A empresa já havia desenvolvido, em outro projeto PIPE-FAPESP, um processo produtivo de dNTPs (desoxirribonucleotídeos fosfatados), utilizados na técnica de PCR.

Fonte: NEWSLAB

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