Estudo do Reino Unido feito com pacientes que tiveram covid-19 e, depois de receberem alta hospitalar, evoluíram com inflamação pulmonar grave pode esclarecer melhor quais pacientes têm maior probabilidade de apresentar disfunção pulmonar persistente.
Além de especificar os que têm maior risco, os achados mostraram que o tratamento convencional com corticoides é muito eficaz na melhora da função pulmonar e redução dos sintomas.
Pesquisadores do Guy’s and St. Thomas’ National Health Foundation Trust, na Inglaterra, informaram que um pequeno percentual de pacientes – 4,8% ou 35 dos 837 pacientes do estudo – apresentou doença intersticial pulmonar (DIP) persistente grave quatro semanas após a alta, principalmente com pneumonia em organização. Desses pacientes, 30 foram tratados com corticoides, todos com melhora da função pulmonar.
A primeira autora do estudo, a médica Dra. Katherine Jane Myall, e seus colaboradores escreveram que o achado radiológico mais comum na covid-19 aguda é a opacificação bilateral em vidro fosco, e que achados de pneumonia em organização são comuns. No entanto, não existem trabalhos sobre o papel dos infiltrados inflamatórios na recuperação da covid-19 ou a eficácia dos tratamentos da doença intersticial pulmonar persistente. “A morbidade respiratória prolongada continua sendo pouco clara”, escreveram Dra. Katherine e colaboradores.
Os achados do estudo são importantes, visto que quantificam o grau de doença pulmonar após a covid-19, disse o médico Dr. Sachin Gupta, pneumologista e especialista em medicina intensiva do Alameda Health System, nos EUA, acrescentando que a evolução e a apresentação da doença seguiram para alguns pacientes o padrão da pneumonia em organização, e a corticoterapia tradicional pareceu resolver os sinais e sintomas, e melhorar a função pulmonar.
“Esta é uma peça realmente importante da engrenagem por descrever o que tem preocupado muitos de nós nos pacientes com doença pulmonar após a covid-19, e qual é o tipo de doença pulmonar que apresentam. Isso traz a possibilidade de tratamento”, disse o Dr. Sachin.
Dra. Katherine e colaboradores observaram que, até mesmo uma “proporção relativamente pequena” de pacientes com doença intersticial pulmonar persistente e grave – como os descritos neste estudo – representa “um ônus significativo de adoecimento”. Os pesquisadores acrescentaram: “O tratamento imediato pode evitar a possibilidade de sequela com fibrose permanente e comprometimento funcional.”
O estudo observacional, prospectivo e monocêntrico acompanhou pacientes após a alta hospitalar por meio de telefonemas quatro semanas após a alta para determinar o estado de saúde deles. Nesse momento, 39% da coorte do estudo (N = 325) informaram ainda ter sinais e sintomas.
Os pacientes fizeram exames ambulatoriais na sexta semana após a alta, e neste momento, 42,9% (N = 138) não apresentavam sinais ou sintomas de doença persistente; 33,8% (N = 110) apresentavam sintomas sem sinais radiológicos e foram encaminhados para outros serviços; e 24% (N = 77) foram encaminhados para a equipe multidisciplinar de tratamento de doença pulmonar após a covid-19. No total, 59 pacientes foram diagnosticados com alterações intersticiais persistentes após a covid-19, dos quais 35 tinham pneumonia em organização, daí o fundamento teórico para a utilização de corticoides neste grupo, segundo a Dra. Katherine e colaboradores.
Os 30 pacientes tratados com corticoides receberam uma dose máxima inicial de 0,5 mg/kg de prednisolona, com desmame rápido durante três semanas. Alguns pacientes receberam doses menores, dependendo de suas comorbidades.
O tratamento resultou em um aumento médio relativo da capacidade de difusão pulmonar de 31,6% (P < 0,001) e da capacidade vital forçada de 9,6% (P = 0,014), além da melhora importante dos sinais e sintomas, e dos achados radiográficos.
O estudo identificou algumas características básicas dos pacientes que evoluíram com doença intersticial pulmonar inflamatória persistente após a covid-19. A maioria era do sexo masculino (71,5%) e tinha sobrepeso, com índice de massa corporal médio de 28,3 kg/m2, mas apenas 26% eram obesos. A maior parte tinha pelo menos uma comorbidade, sendo a mais comum o diabetes e a asma (22,9%). O tempo médio de internação foi de 16,9 dias; 82,9% precisaram de oxigênio suplementar, 55% passaram pela unidade de tratamento intensivo (UTI) e 46% fizeram ventilção mecânica.
Os pacientes mais vulneráveis à doença intersticial pulmonar e à pneumonia em organização foram os “mais doentes” de toda a coorte, disse Dr. Sachin. “De alguma forma, é reconfortante que isso não esteja acontecendo com qualquer pessoa; isso está acontecendo com pacientes cuja doença teve a pior evolução e foram hospitalizados na UTI, na maioria das vezes”.
O estudo mostra que identificar esses pacientes precocemente e iniciar o tratamento com corticoide pode evitar lesão pulmonar persistente e cicatricial, disse Dr. Sachin.
Os pesquisadores londrinos notaram que este não foi um estudo radiológico, de modo que as tomografias computadorizadas não foram formalmente pontuadas antes e depois do tratamento. Os autores reconheceram ainda a que as informações acerca dos exames de imagem e dos achados clínicos são vagas, representando “nada além de uma lenta recuperação contínua”.
Os pacientes com doença intersticial pulmonar após a covid-19 precisarão de acompanhamento continuado para compreendermos melhor o curso dessa doença, afirmaram Dra. Katherine e colaboradores, embora tenham previsto que é improvável que a pneumonia em organização recidive após a resolução.
Fonte: NEWSLAB